28/01/12

A EXPANSÃO

Perante tal quadro sócio-económico e para fazer face ao ambiente monótono que se vivia, as classes dirigentes (as únicas com direito a lançarem empreendimentos) decidem fazer algo para quebrar a morrinha e procurar novos sítios para passarem as férias, que lhes permitissem arejar as mentalidades e partes pudibundas fora deste burgo.

Tal objectivo não se afigurava fácil, pois havia a ideia de que se devia possuir tudo o que se encontrasse, o que, como é lógico, tornava incomportáveis determinados destinos turísticos. Procurando algo de exótico e com boas acessibilidades, nasce a ideia de uma viagem a Ceuta, cidade do norte de África, rica e de bom clima, bem fornecida pelo comércio muçulmano e, indispensável, perto de casa. Foi o primeiro passo dado pelos portugueses no mundo do turismo. Uma esquadra de 200 navios levava a bordo a fina-flor da sociedade portuguesa (que, na altura, ainda dava para encher 200 navios), partindo do Tejo a 26 de julho de 1415 com rumo a Ceuta.

Alguns fidalgos mais polidos (leia-se corteses, e não lustrosos) eram contrários à invasão de Ceuta por tantos turistas sem aviso prévio nem marcações, até porque não gostavam de quem lá estava a morar, e como tal, não se deveria ir bater à porta de quem não se simpatiza. Contudo, foi uma tese que não vingou e a armada de D.João assentou o nalgueiro nas areias de Ceuta. A desbunda foi colossal, a algazarra maior ainda e os portugueses, pouco habituados a fazer turismo, tornaram-se excêntricos e espalhafatosos, assustando os comerciantes locais que a pouco e pouco vão fechando os seus pontos de venda. Os árabes desviam as suas rotas de abastecimento de bens de primeira necessidade (como o ouro e as especiarias), deixando o local sem fornecedores e os portugueses a chuchar no polegar. Alguns muçulmanos formam mesmo uma comissão de moradores que tenta expulsar os portugueses de Ceuta, para que a cidade volte a adquirir sossego.

A burguesia concorda com os muçulmanos e, guiada pelo seu espírito aventureiro, está disposta a partir em busca de novos destinos balneares, enquanto a nobreza discorda e está disposta a correr com os árabes dali para fora, tomando todo o norte de África como região demarcada de turismo. Esta discussão prolonga-se por algum tempo até que um dos filhos de D. João, D.Henrique, decide voltar a casa e fundar uma agência de viagens com destinos radicais, pois analisando o mercado potencial dos clientes burgueses, a coisa parece rentável. É assim que nasce a “Agência Náutica Sagres”, cuja actividade era anunciada como se pode ver no documento seguinte, um panfleto distribuído em 1416:

“Sedes jovem, burguês e gostais de aventura?
Vinde navegar connosco aos destinos mais radicais que possais imaginar! Onde acaba o mundo e ferve o mar, cheio de abismos e mistérios, outrossim povoado de monstros e forças ocultas, onde barcos sem governo são desfeitos e tragados num momento, perante embarcadiços gelados de pavor e mui húmidos em suas calças.
Inscrevei-vos na Agência Náutica de Sagres e o Mar Tenebroso será vosso. Próxima partida: 1418, com destino desconhecido. Seguro não incluído."


Com efeito, em 1418 partiu uma excursão sob a a orientação dos guias João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz Teixeira, que levou os participantes até uma ilha deserta, onde fundaram um porto a que deram o nome de Santo (para se distinguir do outro). No ano seguinte, nova excursão com os mesmos guias e a ajuda de Bartolomeu Perestrelo, tenta voltar a Porto Santo mas o nevoeiro baralha-lhes as contas e aportam a outra ilha deserta. Tomam então duas decisões: primeiro, baptizar a ilha de Madeira, devido ao enorme tronco onde Gonçalves Zarco bateu com os dedos do pé direito ao desembarcar; segundo, passar a fazer mapas das viagens efectuadas, para não voltarem a perder destinos por onde já tinham passado. A excursão de 1431 vai mais longe, inclui meia-pensão e chega à primeira ilha dos Açores, chamada de Santa Maria.

Depois da chegada aos arquipélagos, os excursionistas decidem levar com eles alguns animais (não estamos aqui a escrever com segundos sentidos) e o povoamento das ilhas foi-se efectuando, cronologicamente, pelas cepas portuguesas, pelos rebanhos de carneiros, pelos portugueses, pelos alemães e pelos turistas em geral. Estas viagens ao Mar Tenebroso e a paragens desconhecidas utilizavam na sua propaganda argumentos que, caso existisse legislação aplicável, poderiam ser considerados de publicidade enganosa. Era o caso dos anunciados monstros marinhos, homens de um só olho, sem cabeça ou de uma só perna, que nunca chegaram a aparecer, para grande desgosto dos viajantes amantes de adrenalina.

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