17/03/12

A COSTA AFRICANA (II)

D.Afonso V tinha pouco mais de seis anos, quando o seu pai D.Duarte morreu, por isso a regência ficou a cargo de seu tio D.Pedro, o das “sete partidas do mundo”, que passava o tempo em viagens entre a Europa, a Ásia e África, costume, aliás, que viria a ser copiado por presidentes da república em finais do séc. XX. Quando D.Afonso V fez os catorze anos (e já com buço), as Cortes decidiram que era melhor ter um rei na puberdade do que um rei em parte incerta e entregam-lhe as rédeas do poder. Durante este período de transição, D.Henrique continuou à frente da sua empresa e estabeleceu novos destinos tropicais: em 1441 o Cabo Branco, graças ao guia Nuno Tristão que, apesar de tristonho, consegue estabelecer nova rota para a foz do Senegal, em 1445; no mesmo ano a agência abre filial no seu novo destino, a Guiné.

Controlando o monopólio comercial e aproveitando-se das personalidades um pouco néscias dos habitantes locais, D.Henrique estabelece as suas pousadas e, ao mesmo tempo, funda as feitorias (feiras de turismo) onde vende aos locais sal, trigo, bugigangas, tapetes e mantas dos ciganos, recebendo em troca ouro, marfim e malagueta. Com tais lucros, alcança os lugares cimeiros da lista dos mais ricos da revista Fortune, optando por investir tudo na sua agência, que consegue assim o necessário capital próprio para a sua expansão.

Também dotado para os negócios, o seu sobrinho D.Afonso V lança-se no mercado da alfarroba, vagem adocicada e nutritiva altamente consumida pelos vegetarianos, conseguindo obter em pouco tempo uma posição de destaque. O problema é que o grande industrial do negócio era D.Pedro, seu tio e sogro (pois D.Afonso V casou com a sua prima D.Isabel, sem olhar às estatísticas de mal-formações em rebentos de casamentos consanguíneos). A luta pelo mercado da alfarroba desenvolveu ódios figadais entre os dois e as várias batalhas comerciais de redução de preços e facilidades de crédito entre tio e sobrinho, terminaram com a vitória deste último naquela que ficou conhecida como a “Batalha da Alfarrobeira”, em 1449.

Em destinos turísticos, 1460 marca o início das caravelas-charter para o arquipélago de Cabo Verde, destino bastante requisitado devido às suas praias e camarão a preços acessíveis. Por estas alturas, o peso dos anos leva D.Henrique na sua última viagem até ao apeadeiro da Eternidade, mas fica de pé um empreendimento de tal forma fundamental para a marcha do mundo, que não pode ser abandonado. A Agência Náutica de Sagres é líder mundial do sector, recebe pedidos do estrangeiro e é motivo de admiração para todos, pelo que os reis de Portugal chamam a si a direcção da empresa e a sua expansão continua a espantar gestores estrangeiros e a servir de case-study em diversas universidades.

Fernão Gomes estabelece delegação na Costa da Mina (que se veio a revelar uma mina de turistas), João de Santarém abre ligação para as ilhas de S.Tomé e Príncipe em 1470, Fernando Pó (o drogado) chefia a delegação na ilha do Pó (destino infeliz, devido ao excesso do dito) e em 1472 Álvares Cabral guia a primeira excursão de reformados para lá do Equador. D.Afonso V concorda com o estabelecimento desses destinos, mas como é uma pessoa nova, apresenta novas ideias para o desenvolvimento do turismo terrestre, argumentando que os passeios pedestres, radicais e ecológicos, são um nicho de mercado com grande potencial. Estabelecem-se assim novos destinos africanos no interior de Marrocos que, conforme se viria a confirmar, foram apostas de sucesso.

Em 1458 inaugurou-se o roteiro de Alcácer-Ceguer, destinado a habitantes de Alcácer do Sal; em 1471 foi o ano gordo, com a abertura de filiais em Arzila (com aplicações da dita sobre a pele, para efeitos medicinais), Tânger (cumprindo o sonho de seu tio, para oferecer sumo de tangerina mais barato aos seus clientes) e Larache (terra de grandes carnavais). Perante isto, os soberanos portugueses passaram a ostentar o título de “Rei de Portugal e dos Algarves, daquém e dalém mar em África”, o que, como se compreende, levou a que se gastasse uma pequena fortuna na feitura de novos cartões de visita, com extensão acima do normal.

D.Afonso V viu-se metido em problemas, em 1476, por causa de complicações fronteiriças. Os camponeses castelhanos, até aí dedicados à agricultura e porcoária (só de porcos), resolveram voltar-se para os bovinos bravios, com vista ao estabelecimento das corridas de touros. Um dos animais pulou a fronteira e causou grandes prejuízos nas hortas dos portugueses raianos, o que eles tomaram como sendo uma declaração de guerra e um aviso de invasão. Valentes e destemidos, os portugueses armados de varapaus, picaretas e forquilhas (e alguns armados em parvos, também) partiram para Castela, visando dar uma lição a nuestros hermanos. Só que, desconhecendo o caminho para as quintas, calharam de atalhar pelos baldios onde pastavam os bois bravos que, ao verem gente intrusa, carregaram sobre os portugueses aflitos e desamparados.

No meio da confusão gerada, tornou-se célebre o alferes Duarte de Almeida, o decepado, a quem foi confiada a bandeira portuguesa. Os bois em fúria trucidaram-no, decepando-lhe as mãos com os seus cascos, após o que Duarte de Almeida a segurou entre os dentes, só a largando quando, exausto de forças, caiu numa valeta para não mais se levantar, sendo o estandarte recuperado e posto a salvo por Gonçalo Pires.
Para evitar mais problemas fronteiriços, D.Afonso V ordenou que, a partir dessa data, que ficou conhecida como a da Batalha do Touro, a fronteira fosse totalmente vedada com arame farpado. Assim se fez e não mais surgiram problemas semelhantes.

Quando começou a reinar, em 1481, D.João II enfrentou dois grandes problemas: por um lado, as finanças do reino eram poucas e, por outro, as regalias dadas por seu pai à nobreza, faziam dela uma classe demasiado privilegiada. Encantado com as histórias de Robin Hood, que era já uma lenda em Inglaterra, D.João II decide copiar-lhe o modo de actuação, roubando aos ricos para dar aos pobres (que neste caso era ele, dado o estado das finanças do Estado). Assim tratou de tirar aos fidalgos certas regalias como os descontos na barbearia real, os empréstimos a juros bonificados ou o espaço reservado para estacionamento de coches no seu palácio.

25/02/12

A COSTA AFRICANA

Em 1433 sobe ao trono D.Duarte, filho de D.João I, e face às pressões da nobreza, farta de viajar para ilhas paradisíacas mas sem vida nocturna, pede ao irmão D.Henrique que fomente na sua agência a oferta de destinos mais exóticos. É assim que surge a ideia de promover safaris em África, onde os nobres pudessem gastar as suas energias em caçadas aos leões, leopardos, rinocerontes, mouros e animais afins. Para tal, era necessário conquistar algumas terras africanas, para edificar os hotéis e as reservas de caça. É então dada ordem a Gil Eanes para começar o lançamento de novos empreendimentos na costa africana.

Ao princípio, tal tarefa revelou-se complicada, pois o navegador português encontrava-se aportado no Cabo Não, assim chamado pela obstinação do chefe da alfândega em passar os vistos necessários para seguir viagem. As burocracias eram tremendas pois estavam a cargo do exército. Neste particular, era melindrosa e demorada a questão dos carimbos nos passaportes, da responsabilidade do cabo Bojador, o qual provocava em Gil Eanes um princípio de úlcera nervosa, por ver passar os dias sem se poder fazer ao mar.

Até que, numa manhã de chuva, Gil Eanes entra, completamente fora de si, nas instalações do porto do Cabo Não, e agarra o cabo Bojador pelos colarinhos, obrigando-o a colocar com os dentes o carimbo no seu passaporte. Depois de conseguir o que queria, aplicou uma joelhada no estômago do cabo Bojador, fazendo-o contorcer-se de dor, e partiu para a missão que D.Henrique lhe confiara. Pode assim dizer-se que foi depois de Gil Eanes dobrar o cabo Bojador, que a Agência Náutica de Sagres se lançou definitivamente para o sucesso nas viagens turísticas a destinos exóticos.

Os primeiros resultados aparecem dois anos depois, em 1436, quando o guia Afonso Gonçalves Baldaia descobre o Rio do Ouro. Baldaia ficou rico e baldou-se ao serviço, nunca mais sendo visto em paragem alguma. Pelo reino, D. Duarte ia governando um tesouro cada vez mais exíguo por via de uma despesa pública galopante. Para agravar a situação, algumas terras que eram propriedade da coroa eram arrendadas a nobres que as punham a render mas depois se esqueciam de as devolver nas datas combinadas, fazendo-o muito tempo depois e escapando ao pagamento da sisa, mais tarde, IMT. Devido a estes atrasos e esquecimentos, o povo apelidava estes nobres de “atrasados mentais”, o que inspirou D.Duarte a publicar a chamada “Lei Mental”, que faz retornar à coroa as terras, na data devida.

Entretanto, o negócio das viagens navega de vento em popa e para melhor satisfazer a sua clientela, D.Henrique decide diversificar negócios. Dado que um dos produtos de maior consumo nos seus cruzeiros era o sumo de tangerina, D.Henrique ocorre-lhe pedir a seu irmão D.Duarte que conquiste Tânger, zona de Marrocos especialmente conhecida pelas suas indústrias de sumo desse citrino. O rei concorda e dirige-se à Bolsa de Valores para fazer um take-over à Tânger Ina, S.A., empresa que controla o negócio do sumo.

Mas a operação bolsista corre mal. D.Duarte empenha-se até mais não, mas as propostas dos árabes são melhores, financiadas pelos petro-dólares. O rei e a sua comitiva de advogados ficam na penúria e os muçulmanos ficam muito desagradados com a atitude de D.Duarte, recusando-se até a emprestar algum dinheiro para a viagem de regresso. Após longas negociações, o rei português lá consegue algum auxílio, dando em troca o empreendimento turístico de Ceuta, que agonizava com a falta de fornecedores.
Assim que se apanham com os bilhetes de regresso na mão, os portugueses correm para apanhar a última caravela do dia, esquecendo-se de D.Fernando, o irmão mais novo do rei, que ainda estava a assinar o protocolo da venda de Ceuta. Resignado, heróico de virtude e amor à pátria, D.Fernando, o jovem infante, suporta todas as dores e humilhações de que é alvo por parte dos árabes, que riem na sua cara por a família se ter esquecido dele. Era precisa uma paciência de santo para suportar aquela chacota e em 1443, o “infante santo” como o povo lhe chama, não resiste e morre de tédio em Fez, sozinho, no meio dos maiores sacrifícios e sofrimentos.

Antes disso, em 1438, morre D.Duarte, um monarca que conseguiu o seu lugar entre as grandes figuras da cultura portuguesa, devido à sua personalidade rica e talentosa, como escritor, filósofo, moralista e teórico do desporto. Entre as suas obras contam-se “Leal Conselheiro”, “Arte de bem cavalgar toda a sela” e “Livro da misericórdia”, grandes best-sellers, se bem que, apesar de pouquíssimo divulgadas, obras como “1001 receitas de bacalhau”, “A arte de vender, passo a passo” ou “Reprodução doméstica de coelhos para totós” merecessem figurar nas antologias literárias portuguesas.

04/02/12

A EXPANSÃO (II)

Para lá do incremento turístico, o cluster das viagens radicais trouxe também o desenvolvimento das técnicas de navegação e dos instrumentos com elas relacionados, que chegaram a ganhar alguns certames, nomeadamente, algumas medalhas de ouro no Salão Internacional de Genebra. É o caso dos instrumentos de navegação astronómica (assim chamados pela quantidade astronómica de dinheiro necessário para os comprar), como a bússola, o quadrante (nome derivado do arcaico “quadrado andante”) ou a balestilha, instrumentos já utilizados pelos árabes, mas a quem os portugueses surripiaram os direitos de autor e fizeram algumas modificações, suficientes para evitar as acusações de plágio, táctica adoptada quatro séculos mais tarde pela indústria chinesa.

Os ventos e as correntes marítimas foram também anotados e estudados em cartas que os marinheiros depois mandavam às suas famílias. Como estas cartas vinham do mar, foram naturalmente apelidadas de “cartas de marear” e como a correspondência era muito intensa, os correios do mar tiveram um grande desenvolvimento, sendo a cartografia portuguesa considerada a mais desenvolvida da Europa do séc. XVI. Isto permite entender o sucesso verificado no séc.XX da empresa portuguesa Ndrive e os seus mapas para GPS.

Como as viagens da Agência Náutica de Sagres eram cada vez mais populares, as barcas utilizadas, vagamente semelhantes a cacilheiros, começaram a ser insuficientes para tamanha procura, pelo que começaram a surgir novos navios para as viagens-charter, sem paragens no caminho: as caravelas.
Estas, além de alojamentos que eram um mimo para a época, e se solários instalados no cesto da gávea, possuíam grandes capacidades tecnológicas para a navegação atlântica, pois bolinavam sobre o mar, iam até à Índia sem atestar depósito, tinham velas triangulares (que iluminavam na perfeição) e motores fora de bordo, que lhes permitiam navegar contra ventos e marés.

Como é óbvio, todo este sucesso da Agência Náutica de Sagres teve repercussões no Algarve, já que era daí proveniente a maioria da clientela endinheirada e sedenta de emoção, que procurava os seus serviços. A escolha de Sagres não tinha sido inocente, pois D.Henrique tinha conhecimentos de marketing e dos seus potenciais clientes, sabendo que os ingleses adoravam cerveja e o nome tinha potencial. Outro factor de menor importância, era que, para partida de viagens para sul, Sagres era o mais perto que se conseguia dos destinos e, portanto, com menores custos de exploração.

28/01/12

A EXPANSÃO

Perante tal quadro sócio-económico e para fazer face ao ambiente monótono que se vivia, as classes dirigentes (as únicas com direito a lançarem empreendimentos) decidem fazer algo para quebrar a morrinha e procurar novos sítios para passarem as férias, que lhes permitissem arejar as mentalidades e partes pudibundas fora deste burgo.

Tal objectivo não se afigurava fácil, pois havia a ideia de que se devia possuir tudo o que se encontrasse, o que, como é lógico, tornava incomportáveis determinados destinos turísticos. Procurando algo de exótico e com boas acessibilidades, nasce a ideia de uma viagem a Ceuta, cidade do norte de África, rica e de bom clima, bem fornecida pelo comércio muçulmano e, indispensável, perto de casa. Foi o primeiro passo dado pelos portugueses no mundo do turismo. Uma esquadra de 200 navios levava a bordo a fina-flor da sociedade portuguesa (que, na altura, ainda dava para encher 200 navios), partindo do Tejo a 26 de julho de 1415 com rumo a Ceuta.

Alguns fidalgos mais polidos (leia-se corteses, e não lustrosos) eram contrários à invasão de Ceuta por tantos turistas sem aviso prévio nem marcações, até porque não gostavam de quem lá estava a morar, e como tal, não se deveria ir bater à porta de quem não se simpatiza. Contudo, foi uma tese que não vingou e a armada de D.João assentou o nalgueiro nas areias de Ceuta. A desbunda foi colossal, a algazarra maior ainda e os portugueses, pouco habituados a fazer turismo, tornaram-se excêntricos e espalhafatosos, assustando os comerciantes locais que a pouco e pouco vão fechando os seus pontos de venda. Os árabes desviam as suas rotas de abastecimento de bens de primeira necessidade (como o ouro e as especiarias), deixando o local sem fornecedores e os portugueses a chuchar no polegar. Alguns muçulmanos formam mesmo uma comissão de moradores que tenta expulsar os portugueses de Ceuta, para que a cidade volte a adquirir sossego.

A burguesia concorda com os muçulmanos e, guiada pelo seu espírito aventureiro, está disposta a partir em busca de novos destinos balneares, enquanto a nobreza discorda e está disposta a correr com os árabes dali para fora, tomando todo o norte de África como região demarcada de turismo. Esta discussão prolonga-se por algum tempo até que um dos filhos de D. João, D.Henrique, decide voltar a casa e fundar uma agência de viagens com destinos radicais, pois analisando o mercado potencial dos clientes burgueses, a coisa parece rentável. É assim que nasce a “Agência Náutica Sagres”, cuja actividade era anunciada como se pode ver no documento seguinte, um panfleto distribuído em 1416:

“Sedes jovem, burguês e gostais de aventura?
Vinde navegar connosco aos destinos mais radicais que possais imaginar! Onde acaba o mundo e ferve o mar, cheio de abismos e mistérios, outrossim povoado de monstros e forças ocultas, onde barcos sem governo são desfeitos e tragados num momento, perante embarcadiços gelados de pavor e mui húmidos em suas calças.
Inscrevei-vos na Agência Náutica de Sagres e o Mar Tenebroso será vosso. Próxima partida: 1418, com destino desconhecido. Seguro não incluído."


Com efeito, em 1418 partiu uma excursão sob a a orientação dos guias João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz Teixeira, que levou os participantes até uma ilha deserta, onde fundaram um porto a que deram o nome de Santo (para se distinguir do outro). No ano seguinte, nova excursão com os mesmos guias e a ajuda de Bartolomeu Perestrelo, tenta voltar a Porto Santo mas o nevoeiro baralha-lhes as contas e aportam a outra ilha deserta. Tomam então duas decisões: primeiro, baptizar a ilha de Madeira, devido ao enorme tronco onde Gonçalves Zarco bateu com os dedos do pé direito ao desembarcar; segundo, passar a fazer mapas das viagens efectuadas, para não voltarem a perder destinos por onde já tinham passado. A excursão de 1431 vai mais longe, inclui meia-pensão e chega à primeira ilha dos Açores, chamada de Santa Maria.

Depois da chegada aos arquipélagos, os excursionistas decidem levar com eles alguns animais (não estamos aqui a escrever com segundos sentidos) e o povoamento das ilhas foi-se efectuando, cronologicamente, pelas cepas portuguesas, pelos rebanhos de carneiros, pelos portugueses, pelos alemães e pelos turistas em geral. Estas viagens ao Mar Tenebroso e a paragens desconhecidas utilizavam na sua propaganda argumentos que, caso existisse legislação aplicável, poderiam ser considerados de publicidade enganosa. Era o caso dos anunciados monstros marinhos, homens de um só olho, sem cabeça ou de uma só perna, que nunca chegaram a aparecer, para grande desgosto dos viajantes amantes de adrenalina.

15/01/12

O PÓS CRISE DE 1383-1385

Para comemorar a grande vitória de Alves Barrota, e porque não havia ainda uma rotunda em Lisboa que pudesse ser invadida por multidões em êxtase e buzinas ululantes, D.João I manda encerrar o campo de jogos do clube de futebol local e erguer no seu lugar um mosteiro a que chamou “da Batalha”. Com vista a atrair mais visitantes no futuro, optou-se pela linha arquitectónica que fazia furor na altura, o gótico, assim chamado por parecer ser feito gota a gota, dada a sua morosidade.

Este estilo caracterizava-se por paredes finas (que poupavam nos materiais) e janelas largas, decoradas com vitrais, justamente considerados os antepassados dos grafittis. Existe grande utilização dos arcos, mesmo que quebrados anteriormente, e de abóbadas em ogiva (nuclear, não, obrigado!), que conferiam grande poder aos edifícios.

Em consequência, as naves elevaram-se em altura (partindo para outros planetas), os arcobotantes são colocados no exterior (devido às pulgas), as igrejas tornam-se mais iluminadas pelo sol (a sempre recomendável utilização das energias renováveis) e os edifícios terminam em pináculos, que, ao contrário do que muita gente considera, não são pinhões dados em espectáculos.
Todas estas características da arte gótica faziam-na, nas imortais palavras de António Gedeão, aproximar-se bastante do que ele designava por sonho (é tela, é cor, é pincel / base, fuste, capitel / arco em ogiva, vitral /pináculo de catedral), como pode ser observado em sites tipo You Tube, procurando por "pedra filosofal".

Livre dos perigos de Castela, D.João I decide orientar a sua vidinha e dispõe-se a casar. Assim que o anúncio é feito no correio sentimental da “Gazeta Real”, o rei de Inglaterra coloca um problema a Portugal: os portugueses tinham utilizado no jogo com os castelhanos um árbitro de nome Johnny Rules, nitidamente anglo-saxónico e, como tal, sujeito a pagar direitos de imagem e bom nome aos árbitros britânicos.

D.João I viu-se assim entre o montante e as ameias do castelo, ou, numa linguagem mais contemporânea, entre a espada e a parede. Não poderia argumentar que o juíz era o português João das Regras, pois isso seria um escândalo internacional. Também não poderia por em causa o rei de Inglaterra, pois devido ao tratado de aliança que D.Fernando assinara, qualquer desejo que viesse de além-Mancha era uma ordem. Ou, o que se poderia chamar hoje em dia, um desejo de Merckel.

O rei de Inglaterra desejou que D.João se casasse com uma sua neta, Dª Filipa de Lencastre. E D.João casou, um facto de grande importância na nossa história, por duas razões: primeiro, porque reforçou os laços de entendimento com Inglaterra (quanto mais não fosse porque o rei português teve de aprender inglês para comunicar com a mulher); segundo, porque tornou rainha de Portugal uma mulher excelsa, cheia de virtudes e muito popular entre o povo. Esta popularidade advinha sobretudo do facto de Dª Filipa (e suas ancas parideiras) participarem no programa “Super Bebés”, um programa patrocinado pelo próprio D.João, que deu frutos na mais extraordinária geração de príncipes que alguma vez tivemos. Nomes como D.Duarte, D.Henrique, D.Pedro, D.Fernando e Dª Isabel deram ao programa “Super Bebés” o mérito de só por si encherem uma época e honrarem um país.

Este casamento foi bastante badalado, principalmente pelos sinos da Sé do Porto, e dele nos fala o historiador local, Olibeira Martins :

“Toda a noite fora de festa (...) o bom povo do Porto, na sua cidade triste, quebrava a monotonia dura da vida nesses instantes de folgança. (...) preparou-se o cortejo. O pequeno espaço que vai desde o Paço até à Sé estava coalhado de povo em gala agitando bandeiras e atirando confetis. À porta da Sé, numa nuvem de incenso e num corte de fotógrafos, o bispo (...) esperava os noivos. (...) Da Sé voltaram ao Paço a comer (...) desafivelaram-se os cintos, vazaram-se os cálices de espumoso, as travessas de arroz à valenciana e os pratos de doce de ovos, ao som de jograis cantando “apita o comboio”...

14/01/12

A CRISE DE 1383-1385 (III) – o grande match

Quanto ao jogo propriamente dito, eis a sua crónica como no-la conta o grande repórter desportivo Fernão Lápis, jornalista da Gazeta Lusitana:
“Os castelhanos resolveram assumir as despesas da partida quando o dia já estava adiantado, fazendo avançar as suas cargas de cavalaria em bloco, com grande entreajuda entre os seus sectores.
D.Nuno Alferes Pereira apercebe-se disso e efectua uma arrojada manobra táctica, colocando peões e cavaleiros a actuar pelas faixas laterais, com um trinco a meio campo, resguardado por um grupo de defesas coreáceos. À frente, arqueiros e besteiros faziam o papel de pontas de lança, descaídos para os flancos em constantes movimentações, procurando as desmarcações da frente atacante de soldados lanceiros. Foi a chamada “táctica do quadrado”, um hino à cultura de jogo e que desde início deu resultados, pois os cavaleiros castelhanos caíam sistematicamente em fora de jogo (devido a grandes buracos no meio campo) onde, sem marcações especiais, eles julgavam conseguir vantagem.

O quadrado português consegue suportar, embora com algumas falhas, o assédio castelhano ao nosso reduto e uma vez conquistada a bola no miolo do terreno, lançam-se vertiginosos contra-ataques através dos arqueiros do centro do quadrado. É um período de constante movimento, em parada e resposta de grande beleza e expressividade plástica, em que se denota um ligeiro ascendente da força da técnica sobre a técnica da força.

Por esta altura, os ataques de salmonela começam a fazer-se sentir e muitos castelhanos vão caindo ao chão, com cãibras e vómitos, dificultando a progressão no terreno aos seus colegas, que começam a ter de lutar também com falta de espaços para explanar o seu fio de jogo. O terreno fica atravancado e os castelhanos partem os seus pontas de lança ao meio, para melhor aproveitarem o espaço disponível. É, porém, um esforço inútil.

Nuno Alferes Pereira, um verdadeiro “detestável” em campo, é a alma deste jogo e a sua grande figura. Faz lançamentos em profundidade, ora à direita ora à esquerda, com uma força quase sobrenatural, que deixa os castelhanos pasmados, e a selecção nacional vai-se empolgando com o seu próprio carácter e humildade, trabalhando cada vez mais para a vitória. Apesar de estarem em jejum (não houvera verba para estágio), nunca os portugueses se sentiram mais fortes que naquele momento, em que a independência do nosso futebol, duas vezes e meia secular, está dependente da sua firmeza, da sua obstinação, da sua heroicidade.”

Batido pela nossa valentia e superioridade táctica, o rei de Castela abandona o campo mesmo antes de Johnny Rules dar por findo o encontro, o que motivou a nossa vitória incontestada. Depois deste jogo, apenas resistem alguns indefectíveis do rei de Castela que teimavam em desafiar os portugueses para alguns joguitos de tudo ou nada, embora de menor dimensão. O que teve mais história foi o de Valverde, perto de Badajoz, mas mais uma vez D.Nuno Alferes Pereira deu mostras do seu génio táctico, invadindo a localidade de Valverde com milhares de jogadores e dezenas de milhar de apoiantes do povo, que esgotaram todos os stocks dos comerciantes de Badajoz, que não contavam com tal afluxo de visitantes fora da época das rebajas.

Reconhecendo que não podiam alojar condignamente tantos visitantes e com o seu sistema hoteleiro em colapso, os castelhanos foram obrigados a dar a vitória aos portugueses, mesmo sem haver jogo. E, em 1411, é assinado o tratado em que o rei de Castela renuncia definitivamente à sua pretensão da presidência da federação portuguesa de futebol. O trono português está salvo!

05/01/12

A CRISE DE 1383-1385 (II) – o estágio

O rei de Castela avança pelo Alentejo adentro e a primeira oposição que encontra é a de D.Nuno Alferes Pereira, presidente da Associação Alentejana de Futebol que, como seria de esperar de um verdadeiro desportista, lhe propõe que a questão seja resolvida no campo e não na secretaria. D.João acede e o jogo é marcado para 6 de Abril de 1384. Na véspera, cai uma terrível bátega de água que deixa o terreno verdadeiramente intratável. Ainda assim, o jogo é realizado e a turma alentejana mostra grande valentia, inteireza de vontade e misticismo de fé, os quais lhe trazem a vitória. Devido ao estado do terreno, os castelhanos chamam-lhe a “Batalha dos Atoleiros”, pois passavam o tempo a atolar-se na lama. Por isso exigem desforra, sob pena de fazerem queixa às instâncias europeias, pelo que avançam sobre Lisboa, com o fito de actuar no estádio do Jamor. D.João Mestre de Avis sabe que terá de usar todas as manhas para levar de vencida os castelhanos que, em condições normais, terão um poderio maior. Decide então fechar os portões da cidade de Lisboa, obrigando os adversários a esperar na rua, dizendo-lhes que se estão a ultimar os preparativos.

Após meses de espera, é posto a correr entre o arraial castelhano que a peste está a atacar os seus jogadores. Com medo que os medicamentos de combate à maleita venham a ser detectados em controlo anti dopagem, D.João de Castela desmarca o jogo e é obrigado a retirar. O Mestre de Avis tinha, uma vez mais, salvo a população portuguesa.

Pouco depois, em 1385, reúne-se em Coimbra a assembleia geral da federação para votar o seu novo presidente. Antes de haver acordo, houve larga discussão, no entanto o presidente do conselho de arbitragem, D.João das Regras (outro João!), usou o seu voto de desempate e com argumentos bem manobrados, tem papel fundamental para a nomeação do Mestre de Avis como presidente vitalício da federação e, consequentemente, rei. Mal é eleito, o ex-Mestre nomeia D.Nuno Alferes Pereira como capitão de equipa e treinador da selecção nacional, como prova do seu apreço pela vitória na “Batalha dos Atoleiros”. Devido ao seu querer, abnegação e raça demonstrada em campo, D.Nuno era conhecido pelos adversários como o “detestável”, sendo que a partir daqui todos os seus autógrafos eram escritos como “D.Nuno Alferes Pereira-o detestável”.

Porém, o rei de Castela não desistindo dos seus objectivos, lança um desafio de tudo ou nada, num jogo pouco amigável para o qual recruta uma poderosa selecção de 32 mil jogadores. D.João e D.Nuno não podem recusar o convite, sob pena de sofrerem sanções da FIFA e tratam de reunir os nossos melhores jogadores. Graças aos contributos dos atletas de Coimbra, que passavam mais tempo a namorar no Choupal do que a treinarem (sendo por isso conhecidos como a Ala dos Namorados), conseguiu reunir-se uma selecção de pouco mais de sete mil homens, o que ficava a léguas de distância do plantel adversário. Precisando de algo mais, D.João I convenceu D.João das Regras a ir arbitrar a contenda, disfarçado de juíz inglês, Johnny Rules, para que os adversários não suspeitassem.

O grande jogo foi marcado para 14 de Agosto de 1385, no pino do Verão, para o campo do Alves Barrota Futebol Clube e existem teses que defendem que foi por aí que a vitória começou a pender para as nossas cores. Estava um dia de tremendo calor e os castelhanos resolveram fazer um pequeno estágio de aclimatação nas redondezas do local do jogo, escolhendo a estalagem “Álvares Barrote”. Toda a equipa tomou a última refeição antes do jogo na “Loja da Brites - churrasqueira, padaria, croissanteria, gelataria, pizaria e snack-bar” que funcionava perto da estalagem e que, nesse dia, ganhou a lotaria ao servir 32.000 refeições.

Pensa-se que os croissants com doce de ovos não estavam em bom estado, pois todos os castelhanos que os comeram (praticamente 100% da equipa) tiveram um ataque de salmonela muito violento, que os debilitou bastante durante o jogo. A padeira de Alves Barrota foi por isso acusada em tribunal, mas o processo nunca se desenvolveu e nada ficou provado, pelo que, atribuir a este facto a nossa vitória no jogo poderá considerar-se excessivo.
 
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