08/10/11

ORGANIZAÇÃO DO ESTADO (parte III)

O reinado de D.Afonso IV marcou o início de um período de crise social (mais outro). A população fugiu do interior para o litoral, em busca de praias e bons empregos nas cidades, deixando os campos ao abandono. Tudo se agrava em 1348, com aquilo a que os historiadores (da escola Ariana) costumam designar por Peste Negra, que se traduziu na vinda ilegal para o país de milhares de trabalhadores africanos, que ofereciam o seu trabalho por metade dos salários habituais para os servos da gleba locais.

Este período é designado por peste, uma vez que os trabalhadores que tinham vindo do interior, viam agora os seus postos de trabalho ocupados por africanos ilegais, ficando, por isso, sem emprego, sem sustento e morrendo aos milhares. Durante este período, a população decresceu cerca de um terço, assim o demonstram os censos, embora haja dúvidas sobre a autenticidade destes números, pois, por um lado, os inquéritos não eram preenchidos pela internet, o que dava azo a falsificações e, por outro, o próprio fenómeno da peste apanhou alguns dos responsáveis pela estatística, que morreram antes de completar os recenseamentos. Alguns anos depois, tão misteriosamente como tinha surgido, este período, dos mais negros da nossa história, cessou.
Mas o reinado de D.Afonso IV também teve coisas boas, entre elas a inovação na justiça que, até aí, era administrada por “juízes da terra” - do lugar onde ocorriam os problemas. Ora, devido à sua função de aplicação da justiça, o juiz era considerado um santo homem e, como diz o povo, santos da terra não fazem milagres. Acresce que, por vezes, obter justiça era um milagre, portanto, os homens da terra poderiam falhar. É então que D.Afonso IV descobre o ovo de Colombo (ainda antes do dito) ao inventar a figura de “juiz de fora”, mais independente que o “juiz de dentro” - ao fim e ao cabo, um protótipo do pensamento neo-liberal de administração da função pública, de contratação externa de serviços para algo já assegurado pelo pessoal contratado.

A patente de tal invenção rendeu-lhe bom dinheiro, mas não o suficiente para resolver a crise económico-social que se instalara. Greves, manifestações do operariado e ordens para apertar o cinto (para os que o tinham, dado não ser acessório muito em voga na época), marcavam o ritmo de uma época conturbada. É neste cenário que se dá o episódio dos amores de Pedro e Inês, bastante comentado pela imprensa da época e que até motivou Camões num dos seus devaneios poéticos, o que veio ajudar à propagação do mito. O propósito do autor desta obra (a VERDADEIRA história de Portugal, não os devaneios poéticos) é o de não enganar ninguém, pelo que se opta por contar os factos verídicos e não a versão romanceada que se ensina por aí.

O filho de D.Afonso IV, príncipe D.Pedro, ficou subitamente viúvo pela morte de D.Constança e, pouco depois, tratou de arranjar nova companhia, pois um membro da família real tem a todo o custo de deixar descendência (veja-se o caso de D.Duarte Pio, nos últimos anos do século passado). Após várias tentativas frustradas para encontrar abrigo num colo acolhedor, D.Pedro decide recorrer aos serviços de uma agência matrimonial especialista em juntar pessoas compatíveis. O resultado dos vários testes de sangue e exames psicotécnicos, indica o nome de D.Inês de Castro, senhora de origem castelhana e rara beleza, que imediatamente arrebata o coração de D.Pedro, pronto para o casamento (e também para o acasalamento).

Mas nem tudo era tão fácil como à primeira vista se supunha. O casamento de um rei exige certas burocracias e formalidades a cumprir. Para mais, D.Inês era castelhana e havia o problema da legalização dos estrangeiros, além de que, os funcionários encarregues do processo (Álvaro Gonçalves, Pêro Coelho e Diogo Lopes Pacheco) eram escriturários pagos à hora, interessados em arrastar o mais possível todo o trabalho que tivessem entre mãos. Demoraram-se eternidades, exigiram-se mil e um documentos e as preocupações foram tantas que, entretanto, D.Inês morreu com um ataque de stress pré-matrimonial agudo. D.Pedro entrou numa melancólica depressão nervosa e apenas o ombro amigo da sua mãe D.Beatriz o conseguiu consolar um pouco.

Assim que sobe ao trono, em 1357, D.Pedro adquire uma segunda personalidade, que se vai vingar dos três funcionários burocratas. De dia, ele é D.Pedro I, o rei que vai colocá-los em tribunal com processos por conduta criminosa e lentidão provocadora de danos morais. De noite, ele veste-se de negro e é “Peter-the-avenger”, escrevendo centenas de processos que envia para a agência matrimonial, sobrecarregando os três funcionários com trabalho extra sobre clientes fictícios. Os efeitos de tal vingança são devastadores: Álvaro Gonçalves morre de enfarte cardíaco, a carimbar papéis; Pêro Coelho apanha um esgotamento nervoso a tentar arquivar processos e fica demente mental para o resto da vida; Diogo Lopes Pacheco consegue escapar porque se encontra em férias numa casa de campo do Ribatejo, mas morre no último dia de descanso, colhido por um touro bravo.

Consumada a vingança, D.Pedro tenta voltar à pacatez da sua vida de rei, que no entanto é quebrada de quando em vez por determinações do Papa, que tinham força legal no país, sem o conhecimento do rei. Para contrariar tal costume medieval, D.Pedro institui o “Beneplácito Régio”, forma de português arcaico para a expressão “bem plácido régio”, ou seja, rei bem descansado, o que significava que não quereria ser apanhado de surpresa por um decreto papal e, por isso, cada intervenção da cúria romana na vida portuguesa teria de ser, primeiro, aceite ou não pelo rei.

Em 1367 sucede-lhe o seu filho D.Fernando e, se por um lado tenta salvar o reino da crise que seu pai não resolvera, por outro, o seu bichinho carpinteiro da conquista começa a rabiar e ele lança-se em guerras com Castela. Em busca de terras para conquistar (e por falta de opções, há que reconhecer), D.Fernando lança-se por três vezes contra os vizinhos castelhanos e por três vezes apanha porrada de três em pipa para contar aos netos.

Umas vezes sozinhos, outras acompanhados pelos ingleses (é desta data a aliança luso-inglesa, a mais antiga do mundo e que tantos problemas nos trouxe mais tarde, só resolvidos no Euro 2004), os portugueses apenas conseguiram fazer com que os castelhanos se chateassem a sério, invadindo o nosso reino e cercando Lisboa durante uns tempos. Só depois, D.Fernando cai em si e passa a ter juízo, pois já tinha idade para isso.

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