10/07/11

UM RETRATO GERAL

Por último falemos do rei, a saída profissional mais aguardada pelos jovens, embora a esmagadora maioria não tivesse acesso a ela. Era bem remunerada, tinha todas as regalias sociais praticadas na época e a reforma era garantida, caso não houvessem golpes palacianos.

Praticava-se a monarquia hereditária, uma forma de governo que se caracteriza por buscar o desenvolvimento económico para a família reinante através do lançamento de impostos. Se um pai fosse rei, os seus filhos teriam, em princípio, o futuro assegurado e se é costume dizer-se que o rei estava no topo da pirâmide social, isso é apenas devido ao facto de ele viver no cimo dos montes (onde geralmente se construíam os castelos), mandando em todos e sendo muito rico. Nada mais.

Quanto à economia, o dinheiro não circulava e os terminais de pagamento automático não funcionavam, por falta de invenção da electricidade. Daqui resulta que o comércio interno era reduzido e baseado na troca directa, o que limitava bastante as pequenas mercearias de bairro, obrigando os lojistas a terem grandes stocks de produtos diferentes para trocarem com os clientes. Existiam outros pequenos comerciantes que se deslocavam de povoação em povoação, fazendo o transporte das suas mercadorias nas suas bestas e que eram apelidados, consoante a zona do país, de malmecremes, almacreves, almocreves, ambulantes ou ciganos.
Para além das dificuldades do negócio, estes comerciantes tinham ainda de suportar as portagens que, estrategicamente, estavam colocadas à saída de castelos, cidades, pontes e vias rápidas. Como não podiam voltar atrás eram obrigados a pagar, caso contrário, ficavam sem mercadorias e animais, o que, por outro lado, os dispensava de pagar portagens em situações futuras. O pagamento era feito em morabitinos, mirabitanos ou murabitinhos, consoante a cotação do dia.
Paralelamente, surgem mercados e feiras, locais onde os mercadores ambulantes podiam vender os seus produtos, os agricultores escoarem os seus tomates e os ciganos a sua roupa de marca Ardidas, Mike e Le Quic Sportuf. Desconhecem-se campanhas eleitorais nestes espaços, no entanto existem já relatos de que carteiristas praticavam a sua arte.

O poder ilimitado do rei, que já vimos, não o era, porém, em todo o lado. Os concelhos com Carta de Foral tinham uma certa autonomia de governação, elegiam os seus juízes e faziam as suas leis. Existia a chamada “assembleia de homens-bons”, eleitos pela população para tratar dos seus problemas. Basicamente, um homem-bom era aquele que deixava um rasto de suspiros por onde passava, com as mulheres, casadoiras ou não, a caírem a seus pés. Como é óbvio, eram mais dados a tratarem da sua pele e a mirarem-se ao espelho, do que a tratar dos problemas da comunidade, o que provocava alguns problemas. Principalmente, entre os pais das virgens solteiras.

Neste período de conquista e alargamento do território, três correntes culturais estiveram na base da formação do “homo lusitanus”, como hoje o conhecemos. Desde logo a cultura cristã, algo primitiva e atrasada (porque foi das últimas a chegar), com pouca luz no seu interior, embora fosse aquela que construísse mais e melhor – no entanto, há que reconhecer, janelas não eram o seu forte.

Deste período há ainda a destacar as principais construções, que adoptavam um estilo muito pesado, originando grandes encargos de orçamentação e grande demora na conclusão dos projectos, algo muito diferente daquilo que se passa na actualidade.
Chamado de estilo românico, caracterizava-se por paredes muito grossas (que não deixavam ouvir o vizinho de cima), poucas janelas adaptadas à coscuvilhice, tectos em abóbadas de berço e arcos redondos (que o são, por definição).
 
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